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Rui Moreira acolhe proposta de fundos imobiliários e rejeita defesa do comércio e associativismo local

Rui Moreira e Assunção Cristas no Porto

O grupo Rui Moreira rejeitou na Assembleia Municipal desta segunda-feira uma proposta para alterar no programa "Porto de Tradição" o artigo que exige aos estabelecimentos um fator de viabilidade financeira para a obtenção da classificação.

Este programa visa algumas medidas de apoio ao comércio e ao associativismo face ao processo de especulação imobiliária que se abateu sobre a cidade do Porto, sendo, por isso, contraditório a aplicação de um critério de renatabilidade financeira para a obtenção da classificação.

Ao rejeitar a alteração, Rui Moreira acolhe a proposta de fundos imobiliário como o Emporium 658 - Investimentos Imobiliários, Lda, proprietário do edifício da Confeitaria Cunha, que  defendeu em abril de critérios “mais exigentes”, argumentando que a viabilidade financeira do negócio deveria ser apreciada pelos técnicos do Porto de Tradição. 

Intervenção de Susana Constante Pereira, deputada municipal do Bloco de Esquerda na Assembleia Municipal do Porto

O Bloco de Esquerda considera o processo inerente à procura de uma melhoria deste instrumento um bom exemplo do que deve ser feito em matéria de regulamentos e respetivas discussões públicas, bem como subscrevemos os princípios e os propósitos subjacentes a este documento, que entendemos ser de enorme importância na conjuntura que se vive na cidade.

Vivemos numa conjuntura em que a especulação imobiliária e o fator de atração de que se reveste o Porto para o negócio hoteleiro (tantas vezes disfarçado de Alojamento Local) e de restauração, têm fragilizado significativamente uma série de estabelecimentos e entidades históricas, bem como têm descaracterizado a cidade. Entendemos que este é de facto um instrumento vital contra a elitização da atividade comercial no Porto.

Não podemos no entanto deixar de notar que o tempo que demorou este processo foi o tempo que ditou o encerramento de tantos estabelecimentos históricos na cidade: a Regaleira, o Progresso, a Livraria Leitura, a Adega do Olho, o Buraquinho, o Restaurante Romão, lojas de ferragens pela rua do Almada abaixo, a Araújo & Sobrinho. Para não falar das que resistem, mas são também alvo de bullying imobiliário, que afeta também estes estabelecimentos e entidades.

Note-se por exemplo que, no caso do processo da Confeitaria Cunha, quando esta recorreu da avaliação que determinou que ficasse de fora da lista das lojas históricas, o fundo que pretendia adquirir o edifício, o Emporium 658, contestou a argumentação daquele estabelecimento, recomendando à Câmara que a sustentabilidade financeira deveria ser um aspeto a ter em conta enquanto critério no âmbito do “Porto de Tradição”.

Aliás, fundo esse que se pronuncia em sede de discussão pública, como consta do relatório que recebemos, dizendo que o critério da viabilidade financeira deveria até ter um peso maior na ponderação total e propondo que se apresentasse mais documentação para essa avaliação (como as declarações de não dívida às finanças e à segurança social), proposta que a Câmara acolhe, não acolhendo as propostas de retirar aquele critério apresentadas pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto e por Marta Nestor, membro do grupo de trabalho do “Porto de Tradição”.

É por este motivo, pela existência deste critério que consideramos poder ser até contraditório relativamente às preocupações enunciadas neste regulamento com a proteção dos estabelecimentos e entidades históricas da cidade, que nos vemos obrigados a votar contra esta proposta.

Se recuarmos 5 anos - período proposto para apresentação de resultados positivos pelas entidades candidatas - damos por nós em 2013/2014, altura em que sabemos bem que o impacto da passagem da troika por Portugal e das medidas de austeridade determinavam que todos os meses sucumbiam dezenas de empresas no país. Corresponder ao critério aqui proposto implicaria ter ‘passado pelos pingos da chuva’ nesse período e ainda ter escapado à proliferação de novos negócios de ‘fast food’ e ‘franchisings’ multinacionais.

Mais uma vez parece que a resposta para o estado permanente de sobrevivência em que se encontram estas lojas históricas, precisamente porque não estão protegidos, não só tarda, como não irá de facto proteger tantos que aguardavam pelo desfecho deste processo.

Este é de facto um fenómeno que tem conduzido à perda de estruturas de proximidade, que muitas vezes são garante do quotidiano das pessoas da cidade, e é ao lado das pessoas que está o Bloco.