A discussão pública da proposta de Regulamento Municipal de Alojamento Local no Porto está aberta desde o dia 17 de julho. A 23 de julho, o executivo municipal aprovou uma medida de suspensão de novos registos de Estabelecimentos de Alojamento Local na cidade. Foi necessário esperar quase um ano após a aprovação da legislação (Lei 62/2018) para Rui Moreira dar um passo concreto nesta matéria. Um passo tímido, ineficaz e que pouco ajudará no direito à habitação e ao planeamento urbano do Porto.
Em primeiro lugar, é revelador que a aplicação da lei e do regulamento não tenha sido responsabilidade do Pelouro da Habitação e do Pelouro do Urbanismo, mas esteja exclusivamente sob a tutela do pelouro da Economia, Turismo e Comércio. Uma leitura que privilegia o mercado em detrimento das pessoas.
É igualmente preocupante constatar que o executivo tenha optado por suspender a autorização de novos registos (até à aplicação do novo regulamento) nas áreas definidas como “áreas de contenção condicionada”, apenas onde o Alojamento Local (AL) é já superior a 50% do total de habitações. Se em Lisboa a discussão sobre a suspensão foi feita entre os 10% e os 20%, Rui Moreira defende que, numa mesma rua, metade das habitações possa ter um fim exclusivamente lucrativo. É de tal ordem caricata a situação que foi necessário publicar uma informação adicional com a indicação de que existe no Gabinete do Munícipe um mapa detalhado, com georreferenciação para evitar “discrepâncias interpretativas”.
Ainda assim, o executivo camarário tem veiculado que procedeu à suspensão do licenciamento no Centro Histórico e no Bonfim, quando tal não é verdade: a suspensão vigora apenas em algumas zonas desses territórios. Em todas as restantes zonas o AL vai continuar e, provavelmente, aumentar de forma intensiva (consultando o RNAL, pode verificar-se que nos 10 dias decorridos desde a entrada em vigor da suspensão, houve 113 novos registos - o dobro dos registos feitos nos dez dias anteriores ou nos dez dias anteriores a esses).
Mapa das zonas suspensão publicado pela CMP (Edital NUD 260310/2019)
Perante a pressão da especulação urbana e da profunda crise de habitação, o Porto precisa de medidas corajosas e eficazes, como a suspensão de novos registos de Alojamento Local em todo o território da cidade, até que o novo regulamento esteja em vigor, tal como o Bloco de Esquerda tem defendido.
Por fim, é necessário que o novo Regulamento seja um instrumento ao serviço da cidade, e não uma manta de benesses e excepções que convertam o documento numa verdadeira desregulação totalmente ineficaz no que diz respeito à garantia do direito à habitação. Para exemplificar com alguns aspetos concretos patentes na proposta de regulamento apresentado pelo executivo:
- a presença da figura do mediador em reuniões de condomínio, segundo o art.º 3.º, alínea e), só pode ocorrer em reuniões de condomínio que tenham como ponto único esta questão, o que denota uma total dissociação da vida quotidiana das pessoas e do funcionamento dos condomínios;
- não estão previstas salvaguardas no que toca às condições físicas do estabelecimento de alojamento local, como por exemplo no que diz respeito ao isolamento para situações de grande rotatividade, relativamente às quais as queixas de ruído já se vão acumulando;
- a dificuldade de suspender a atividade de Alojamento Local num prédio, por decisão da maioria dos condóminos, está prejudica neste regulamento, tendo que ser precedida de ação do Mediador de AL e de audiência dos interessados, vigorando a suspensão, quando conseguida, pelo período máximo de um ano (um procedimento que, mais uma vez, não tem como preocupação central o direito das pessoas à sua habitação);
- a proposta de delimitação e segmentação das zonas é pouco cuidada, permitindo que haja ruas e/ou quarteirões inteiramente destinados a AL.
É neste contexto que o Bloco de Esquerda apela à participação de todos na discussão pública deste regulamento, estando ao lado dos que querem uma cidade onde o direito à habitação está à frente dos interesses do mercado.
Porto, 2 de agosto de 2019
A Comissão Coordenadora Concelhia do Bloco de Esquerda do Porto