Viver e estudar no Porto não pode ser um luxo

Nos últimos anos, a cidade do Porto, com o alto “patrocínio” da Câmara Municipal, tem assistido a um crescimento – conceito bem distinto do de desenvolvimento - baseado quase exclusivamente em mais turismo, mais investimento no turismo, mais reconhecimento internacional. No entanto, por detrás deste aparente sucesso, esconde-se uma realidade sombria para milhares de estudantes que escolhem esta cidade para estudar: o alojamento tornou-se um luxo. Em vez de se preocuparem apenas com exames e estágios, os estudantes enfrentam hoje uma luta diária para encontrar um teto que não consuma a totalidade do seu orçamento – quando não os obriga, simplesmente, a desistir.

Em 2025, é comum ver quartos no Porto a serem arrendados por 500, 600 ou até 700 euros. Não estou a falar de apartamentos, mas de quartos. Alguns nem janela têm. Outros exigem duas ou três rendas adiantadas e cauções ilegais, quase sempre sem contrato escrito. Para estudantes bolseiros ou de famílias com rendimentos baixos, estes valores são incomportáveis. A equação é simples: ou se estuda, ou se trabalha a tempo inteiro para pagar renda – ou não se vem para o Porto.

A raiz do problema é conhecida e múltipla. Primeiro, a falta crónica de residências universitárias públicas. A Universidade do Porto e o Politécnico têm capacidade limitada, e as listas de espera aumentam a cada ano. Depois, há a pressão do alojamento local e do investimento imobiliário especulativo, que retira habitação do mercado de arrendamento tradicional e inflaciona os preços. Finalmente, a ausência de regulação eficaz permite que tudo isto aconteça com uma naturalidade escandalosa.

A responsabilidade é também - e não é pouca! - do município do Porto, que durante anos apoiou e incentivou a monocultura do turismo como modelo económico, sem salvaguardas para a população residente e estudantil. A cidade transformou-se num produto de consumo rápido, com o centro histórico entregue ao alojamento local, ao passo que nenhuma estratégia séria de habitação verdadeiramente acessível foi implementada. O resultado é uma gentrificação acelerada, que expulsa não só moradores de longa data, mas também os jovens que aqui pretendem construir o seu futuro académico. O Porto passou a ser uma cidade que se exibe para fora e se esvazia por dentro.

O Estado tem prometido soluções. O Programa Nacional de Alojamento para o Ensino Superior foi anunciado como a resposta a esta crise, mas os prazos escorrem como areia entre os dedos. As obras atrasam-se, os concursos emperram, e o que era urgente torna-se crónico. Os estudantes, esses, não podem esperar.

Esta situação é mais do que uma crise habitacional: é uma crise de acesso à educação. Quando o custo de um quarto ultrapassa o valor de uma bolsa de estudo, estamos a excluir – de forma silenciosa e eficaz – os estudantes com menos recursos. E isso mina os princípios de igualdade e justiça que deviam estar na base de qualquer democracia.

O Porto não pode continuar a crescer à custa da expulsão dos seus estudantes. É preciso coragem política para regular o mercado, construir mais habitação pública e garantir que ninguém tem de escolher entre estudar ou ter onde viver.

Porque viver e estudar deviam ser direitos compatíveis, e não um privilégio para poucos.