Bolhão tem de voltar a pulsar

No âmbito da campanha eleitoral, regressámos, no passado Sábado 4, ao Mercado do Bolhão, um dos espaços mais emblemáticos do Porto. O Bolhão é mais do que um edifício histórico, é um coração pulsante da cidade, um símbolo do comércio tradicional, da vida comunitária e da resistência quotidiana de centenas de trabalhadoras e trabalhadores.

No entanto, por detrás das fachadas restauradas e da imagem “instagramável” promovida pelas campanhas turísticas, esconde-se uma realidade dura: comerciantes confrontados com contas elevadas (das rendas e de energia sendo, esta a mais significativa), regras impostas sem participação, e um modelo de gestão que privilegia a exploração económica em detrimento da função social do mercado.

O Bolhão foi alvo de uma reabilitação que sempre defendemos - ao contrário de outras forças políticas, com o PSD à cabeça, que queriam privatizar o mercado -, e que, embora necessária em termos de infraestrutura, foi acompanhada de uma lógica profundamente neoliberal: transformar espaços públicos e comunitários em produtos quase exclusivamente turísticos. O que se apresenta como “modernização” é, muitas vezes, um processo de expulsão disfarçado — de quem trabalha, de quem vende, de quem habita.

Durante a visita, ouvimos relatos de dificuldades no pagamento de rendas, de perda de autonomia dos vendedores e de imposição de modelos comerciais que favorecem a turistificação em detrimento dos pequenos negócios locais. Muitos dos problemas atuais decorrem do tipo de gestão assumido pelo município, que colocam o lucro acima do direito à cidade e da preservação da função social do mercado.

É igualmente com grande perplexidade que constatamos o silêncio ensurdecedor que pairou sobre este tema ao longo da campanha eleitoral e dos debates públicos. Nenhuma das restantes forças políticas quis confrontar esta realidade. Esse silêncio é significativo: ou têm medo de perder votos, ou não estão dispostos a comprometer-se com uma solução que reverta a gentrificação a que o Bolhão está hoje exposto. Mais curiosa ainda é esta atitude quando a maioria dos portuenses não se revê no Bolhão actual — um espaço que deixou de lhes pertencer. Muitos dos poucos clientes tradicionais afastaram-se, dizendo claramente que já não se sentem bem naquele mercado.

O Bolhão deve ser gerido com transparência, participação e prioridade ao comércio local e popular. Deve continuar a ser um espaço vivo, onde se cruzam gerações, culturas e modos de vida — e não uma montra estéril para consumo turístico.

A cidade não pode ser entregue aos interesses do capital imobiliário nem transformada num parque temático. O Porto precisa de políticas públicas firmes para proteger os espaços comuns, apoiar quem trabalha e garantir que os mercados históricos permanecem acessíveis à população.

Do Bolhão ao resto da cidade, a luta é a mesma: pelo direito à cidade, pela defesa do espaço público e contra a privatização do que é de todas e todos.