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Mais uma família sem casa, ainda mais carência habitacional.

Elisabete Carvalho

O despejo ocorrido nesta sexta feira, de Joana Pacheco e seus dois filhos menores de 8 e 12 anos, residentes numa casa municipal na Rua da Fonte Taurina, desde 2017, merece a total condenação por parte do Bloco de Esquerda.

São especialmente chocantes e denotam má fé por parte da Câmara as condições em que este despejo ocorreu: a moradora foi chamada à Câmara Municipal para uma reunião com o Provedor do Munícipe por causa do processo em causa e enquanto estava nessa reunião, a sua casa foi arrombada, os seus pertences retirados e a fechadura alterada.

Tendo solicitado, atempadamente e em conformidade com o Regulamento de Gestão do Parque Habitacional do Município do Porto, a sua integração no agregado familiar do seu pai, de quem foi cuidadora informal até ao seu falecimento, foi sucessivamente obtendo respostas de recusa ao pedido sem qualquer tipo de justificação ou apresentação de alternativa.

Na sequência da comunicação à Domus Social do falecimento de seu pai, em maio de 2018, a Câmara passou a designar como “ocupação ilegal” o uso da habitação onde Joana Pacheco residia, procedendo à notificação para desocupação da habitação, mais uma vez sem apresentação de qualquer solução alternativa ou sem que assumisse qualquer responsabilidade em encontrar uma solução alternativa de habitação, por considerar, como expressamente

escrito na correspondência enviada, “mais do que suficiente” o período decorrido para tal.

Manifestam assim, Câmara Municipal e Domus Social, uma gravíssima ignorância da Lei de Bases da Habitação 83/2019 de 3 de setembro, onde está expressamente plasmado que “O Estado é o garante do direito à habitação” e que, além da “efetiva garantia desse direito a todos os cidadãos”, “os imóveis ou frações habitacionais detidos por entidades públicas ou privadas participam, de acordo com a lei, na prossecução do objetivo nacional de garantir a

todos o direito a uma habitação condigna”.

Em resultado da iniciativa parlamentar do Bloco de Esquerda, que contou com a abstenção do PSD e CDS-PP, a Lei de Bases define ainda o despejo como “o procedimento de iniciativa privada ou pública para promover a desocupação forçada de habitações indevida ou ilegalmente ocupadas”, e garante que na "proteção e acompanhamento no despejo o Estado, as regiões autónomas e as autarquias não podem promover o despejo administrativo de indivíduos ou

famílias vulneráveis sem garantir previamente soluções de realojamento, nos termos definidos na lei".

Ao responder negativamente aos sucessivos pedidos de prorrogação de prazo de desocupação apresentados pela moradora, que continua/ou a pagar a renda com emissão dos respectivos recibos no seu nome, a Câmara optou por recusar o direito à habitação desta família e escusa/ou-se, através da força e sem estabelecer qualquer diálogo, a procurar uma solução, indo contra as definições consagradas na Lei de Bases da Habitação.

Este é mais um exemplo trágico da falta de respostas habitacionais na cidade, que não se resolve com a manutenção de uma política de despejos e alienação do direito à habitação das pessoas, mas sim aumentando o ‘stock habitacional’ do município, para usar as próprias palavras do Presidente da Câmara quando, na última reunião do Executivo, assumiu que só assim se poderia justificar "a abertura da matriz" para permitir que mais pessoas sejam abrangidas.

Estas e outras situações chamam a atenção para a gravidade das decisões e escolhas do município dirigido por Rui Moreira e de diversas forças políticas da cidade, face a este gravíssimo problema. Ainda recentemente foi debatida a Estratégia Local da Habitação para o Concelho do Porto, onde a lista de espera para casas municipais é superior a 1000 famílias e os dados da carência habitacional, datados de 2017, apontam para mais do dobro desse número.

Quando se exigiria a construção de centenas de fogos para fazer face à falta de habitação pública, não sujeita, portanto, ao mercado e à especulação imobiliária, foi aprovado um documento na Assembleia Municipal que apenas propõe construir 200 novas casas no prazo de cinco anos, número de casas absolutamente irrisório perante as graves necessidades habitacionais da cidade, documento esse aprovado apenas com os votos favoráveis de Rui Moreira/Porto Nosso Partido, com o voto contra do Bloco e com a abstenção das restantes forças. Consideramos necessária a intervenção dos poderes públicos - onde se inclui não só o Governo, mas também o Município - na resposta a esta crise habitacional e para tal é indispensável o devido investimento em habitação pública.

Exprimindo a sua solidariedade com esta moradora e sua famíla o Bloco de Esquerda continuará a lutar para que o Município abandone uma política que entendemos negligente do ponto de vista do que é o direito humano à habitação, aliás previsto no artigo no 65 da Constituição da República Portuguesa. 200 novas casas em cinco anos: é isto que vai dar resposta a este flagelo? Quantas tragédias mais serão necessárias? No nosso entender, a Câmara Municipal deve reverter, com carácter de urgência, este despejo perpetrado em condições atrozes, atuar em

conformidade com a Lei de Bases da Habitação e assumir a sua responsabilidade no acompanhamento da situação desta família; e deve proceder-se à revisão urgente da Estratégia Local de Habitação que, a manter-se, se traduzirá na contínua sangria dos despejos na cidade e na permanente alienação do direito à habitação de cada um e de cada uma.

 

29 de fevereiro de 2020

A Comissão Coordenadora Concelhia do Bloco de Esquerda do Porto

O Grupo Municipal do Bloco de Esquerda